Estudante de doutorado e professor universitário no Canadá: meu percurso na Université de Montréal

Brasil

Fazer o doutorado logo após o término do mestrado nem sempre é uma boa ideia. Com um bacharelado em História pela Universidade de São Paulo (USP) e um mestrado pela École des hautes études en sciences sociales (EHESS), em Paris, pareceu-me importante ter um período “extrauniversitário” para arejar as ideias antes de embarcar em um projeto acadêmico tão exigente.

Durante essa pausa dos estudos, fui contratado como professor de francês pelo Senac São Paulo, escola associada ao governo do Quebec para o ensino da língua, onde dei aula para muitos interessados em imigrar para o Canadá. Quando finalmente decidi que era hora de partir para o doutorado, pensei: por que não ir para Montreal? A cidade parecia incrível, eu já falava francês e faria a tese na mesma língua em que havia escrito a dissertação de mestrado.

Escolha feita, comecei a preparar o projeto e, em seguida, a contatar os professores da Université de Montréal em busca de um(a) orientador(a). Fui aceito no programa de doutorado em História da Arte e, ainda no Brasil, consegui a minha primeira bolsa da UdeM: a Bourse C, bolsa de isenção das taxas suplementares cobradas aos estrangeiros. As universidades no Canadá são pagas, e estudantes estrangeiros têm de arcar com taxas muito mais altas. Essa bolsa garantiu que eu pagasse os mesmos valores dos estudantes quebequenses, o que viabilizou meu projeto de estudos. Tenho vários colegas estrangeiros, e todos (ou quase) receberam esse benefício. As bolsas de financiamento (equivalentes a CAPES, FAPESP, FAPERJ, etc.) são mais difíceis de se obter, sobretudo porque muitas são restritas aos cidadãos canadenses ou residentes permanentes. No entanto, a novidade de 2017 é que, pela primeira vez, o Fonds de Recherche du Québec (FRQ) abriu seu concurso de bolsas de doutorado para os estrangeiros que já estejam no Quebec há pelo menos 6 meses. É uma ótima notícia!

Já que obter bolsas de financiamento pode ser difícil, como sobreviver como doutorando estrangeiro na Université de Montréal? São muitas as oportunidades de trabalho. Há contratos de assistente de pesquisa em projetos de professores e de assistente de ensino, em que você é encarregado da correção de trabalhos e provas de alunos de graduação. Há também uma infinidade de pequenas bolsas (admissão, redação, bolsas de excelência) às quais todos podem postular sem distinção de nacionalidade. No meu caso, tive dois contratos de assistente de pesquisa logo no meu primeiro ano e recebi várias pequenas bolsas que ajudaram muito no meu orçamento.

Outra possibilidade, sobretudo para quem já passou pela qualificação, são os contratos de chargé de cours, professor temporário na universidade, contratado para dar aula na graduação. Hoje, além de doutorando, sou professor no Departamento de História da Arte e de Estudos Cinematográficos. Dei os cursos de Histoire des collections, no trimestre de inverno de 2016, e Les Arts modernes en Amérique latine, inverno de 2017, mesmo curso previsto para 2018. Além de terem sido importantes para o financiamento da minha pesquisa, esses contratos são um ganho profissional relevante, já que vou sair do doutorado com experiência de professor em uma universidade de grande porte e internacionalmente reconhecida.

Fazer doutorado no exterior é um desafio. Se eu tivesse ficado no Brasil, a minha vida hoje seria muito mais fácil, pois eu escreveria a tese na minha língua (por mais que o meu conhecimento de francês seja bom, não é como escrever em português), não teria tantas limitações para conseguir financiamento e ainda estudaria em uma das muitas universidades brasileiras de excelência. No entanto, apesar de algumas dificuldades, continuo achando que vale muito a pena. A Université de Montréal mostrou-se, de fato, uma boa escolha para mim: a cidade é linda, segura e culturalmente rica, a UdeM tem uma comunidade internacional muito ampla, o que eu valorizo muito, e a experiência como professor universitário é algo que eu não esperava ter ao sair do Brasil, mas que tem sido das mais prazerosas da minha estadia aqui.

Diogo Rodrigues de Barros é doutorando em História da Arte e professor temporário no Departamento de História da Arte e Estudos Cinematográficos na Université de Montréal (UdeM).

*Texto publicado no blog Estudar Fora no dia 10 de dezembro de 2017.